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Lhe vi Tomando Banho
Quando se tem certeza das coisas, é assim mesmo. O destino permite ficar falando com clareza, não desejando, mas afirmando, e, principalmente com quem vive de forma amena, serena, rotina sólida e afável... O exato acontecido com Péricles, diretor de comunicação de uma empresa de médio porte: senhor Péricles Prastes.
Casa boa, esposa boa, dois filhos bons: uma boa menina e um rapaz, o caçula, também bom. Bom salário, bons amigos. No entanto, o mais bom de todas as coisas era a vizinhança: nela incluíam-se os amigos do bar, de jantares, do futebol, das reuniões dançantes, e até mesmo alguns do trabalho. E o que mais lhe encantava, também encantava a todos os homens da rua, cada partícula de testosterona suspirava pela carne feminina, a estrela da rua, o brilho de todas as noites e sonhos era a mulher do vizinho, a patroa do nº 304, duas casas após a residência de Péricles, esposa do ilustre médico Jacinto Novaes. Estrelícia Góes Novaes, a citada esposa do médico, era uma mulher de pouca idade, e segundo as más línguas, muito fogosa e a pior de todas as coisas: adúltera. Muitos dos amigos e vizinhos de Péricles relatavam já terem usufruído dos prazeres daquele corpo delicado e libidinoso. Era o sonho de qualquer homem: voz doce, seios fartos, cabelos louros platinados, nádegas e pernas na conformidade da perfeição, maças do rosto bem torneadas e levemente ruborizadas como num eterno efeito de blush, boca de tons exóticos e olhos azuis expressivos em demasia, como o céu num dia de ascensão de Nossa Senhora, repleto de fiéis a terra rezando por suas almas... Assim eram seus olhos, porém ao invés de oração pedindo perdão, sentia-se mais pecado. Suas roupas denunciavam mais ainda a ousadia e brincava com as cabeças de terno e gravata, um sorriso e um rebolado era o bastante para provocar conseqüências irreversíveis. Sua fama era das mais terríveis e indecentes. Os boatos corriam como pólvora, mas ela não se importava, pelo contrário, se portava como a quase personagem dos comentários alheios, e vivia insinuando-se a qualquer projeto de glande. A elegante dona de casa, não obtinha qualquer outro afazer profissional fora do lar, ficando sozinha boa parte, podendo luxuriar sem preocupação... E o ilustríssimo esposo? Era tão atarefado, e, de certa forma “tapado”, que não se dava conta do “a mais” que possuía e fazia sua mulher, ou fazia não ver para não preocupar-se além das obrigações do consultório.
Péricles tinha lá suas fantasias, mas era casado, tinha filhos, e acima de tudo: fiel! Como um homem de verdade tinha de ser. E jamais fora tentado pela vizinha, e não pretendia ser. Ouvia todas as conversas, mas não compartilhava e nem, queria uma vida daquelas para ele, nunca!
Todos os dias eram diferentes, mas na monotonia previsível de seu lar, ele conseguia calcular cada passo, a mínima molécula a mover-se no vão do nada já fora muito antes imaginada. E assim a esposa refazia seus pensamentos... O que tornava a vida uma extrema barbárie.
Ele chegaria do trabalho as 17h, sua esposa não estaria em casa, então ele largaria sua pasta executiva e relaxaria o corpo na poltrona do papai que ganhara não de seus filhos, mas de seu pai, seus filhos também não estariam, a escola ainda era seu paradeiro. Dentro de dez minutos a cônjuge abria a porta com sorriso largo porque sabia que o marido já havia chego, e nas mãos trazia o pão: 4 salgados, 4 doces de banana, e um pequeno bolo inglês recém saído do forno da confeitaria, ainda quente cujo o vapor umedecia o papel pardo do embrulho numa mancha que mais parecia gordura. Ela inclinava-se sutilmente a beijar a testa do amado e partiria para a cozinha o convidando adoravelmente a tomar café, ele não estava com fome, pois tomava café na empresa pouco antes de sair, no entanto aquela voz feminina soava tão irresistível, e inquiridora, lhe trafegando na imaginação um café digno de deuses romanos, um banquete da alta corte francesa do século XVIII, e a simples companhia de uma família toda junta mais uma vez era suficiente para convencer-lhe a integrar uma das seis cadeiras da copa. Completando a missão diária do destino, seus filhos chegavam juntos, lhe beijavam a testa e todos iam tomar café juntos.
Instantes após o pensamento, toda lembrança concretizou-se, e do sofá não se moveu para não quebrar o rito.
Ouviu a esposa na rua, a voz aproximando-se no linguajar com a vizinha, abriu a porta, em cada mão uma sacola, numa delas contando além do pão, o bolo inglês, no rosto um sorriso, e na testa do marido um beijo, os passos ligeiros para a cozinha, e de lá o irresistível convite para complementar a mesa, mas antes disso suas crias chegaram, e brindaram-lhe a testa com mais um afago dos lábios. Mas seu café foi interrompido pelo soar da campainha, a esposa atendeu e era a vizinha, Sra Estrelícia, um recipiente ornava-lhe os delicados dedos, e contrastava com o vestido de bolinhas, precisava de açúcar para seu bolo, e de mais admiradores para seu sorriso: um céu limpo cheio de estrelas. Sua vasilha foi preenchida com o pó alvo e cintilante e deu as costas àqueles simples mortais. Era com certeza a mulher mais bonita de toda década de 50.
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Daquele bolo, eles provavelmente iriam comer, era uma festa para o bairro na casa do médico, festa para o qual toda família Prastes recebera caloroso convite... O médico era bom demais, e sua esposa então...
Aquela mulher deveria estar querendo alguma coisa naquele lar sano, era a casa mais rica de todo bairro, uma das mais de toda cidade, e ela não tinha açúcar em casa? Por que não mandou um dos empregados ir buscar em qualquer mercearia? Falta de dinheiro? De imaginação? Talvez pretensões com algum vizinho, aquele vizinho, e começar pedindo-lhe açúcar era um fato inicial de bastante bom grado.
Os filhos todos de banho tomado, a mulher perfumada como uma extinta rosa, elegantes, finos para o jantar na casa do doutor. Um bar cheio de amigos convidava a uma passagem rápida.
- Cheguem primeiro, eu só vou dar uma palavrinha com eles e já estou indo. – Indicou Prastes a família, e assim fizeram.
Não era o único a desenrolar o esquema familiar que propora, todos os amigos do bairro que ali estavam, haviam saído com seu clã, e estacionado sozinhos no boteco. A conversa eram dia-a-dia paralelo, quase não se tinha mais assunto, apenas alguns discutiam sobre Audrey Hepburn e Ava Gardner:
- Audrey é bem mais bonita. O fato de usar o cabelo preso enlouquece os homens. Você fica imaginando-os soltos contra o vento, ela vindo em sua direção...
- E pra que imaginar se a Ava usa os cabelos soltos e se pode ver sempre balançado-os ao vento.
- Mas a Audrey lutou muito mais para conseguir a carreira que tem hoje. Vocês não se lembram de como a mídia dizia que ela era ossuda, esquelética. Até que ela padronizou-se como modelo, além de bonita é inteligente.
- Falando em inteligência, não esqueçam que Ava está divorciada há pouco tempo de Artie Shaw, com quem sua vida foi repleta de obras literárias e cultura de todas as formas.
- E quem levou um oscar das duas? Hepburn é favorita no quesito.
- Ava tem aqueles olhos que lembra uma gata, e a deixa cheia de mistério, muito mais desejada.
- Hepburn tem o sorriso transparente de quem não tem nada para esconder ao mundo!
- Gardner é muito mais mulher, tem muito mais classe, sua beleza é exótica e arrebatadora.
- E Audrey tem uma beleza inocente, que muito antes de ser admirada é cativante.
- ...
- ...
Não chegariam a lugar algum discutindo os dotes das divas de Holywood, dirigiram-se ao recinto final daquela memorável noite.
O clima era o mesmo de sempre, as mulheres em um amplo cômodo conversando, as crianças brincando no imenso quintal dos fundos, os adolescentes na varanda traseira da casa, e os homens com seus coquetéis de luxo ficavam no salão de festas, perto do antro onde estavam as mulheres. Todos rindo, petiscando especiarias. E surge na roda um licor novidade, e como é homem de muito prestígio, Prastes é servido sem demoras pelo Sr. Armindo Flores, morador da rua de trás. O licor de pimenta e hortelã, num semi-tropeço virou poça sob a madeira corrida e luva nas mãos do distinto vizinho. Mais uma vez a vítima do involuntário erro pode adivinhar o que aconteceria na seqüência: alguns dos amigos ficariam preocupados pela mancha na rara e cara madeira do chão, outros tantos nem um pouco e sim extasiados de hilária. O culpado do acidente colocaria os objetos de volta ao bar, num golpe das pernas retornaria pedindo mil desculpas e ruborizado. A esposa do acidentado adentraria de sopetão eleve nos saltos, com olhos curiosos e em único suspiro de repreensão diria sem expressões que estava demorando muito para que tal “brincadeira” acontecesse, e quando notassem uma serviçal já estaria limpando tudo.
Pois foi que as vozes em meio volume afastaram-se apreensivas pela sujeira líquida, no entanto do outro lado, como torcida oposta, alguns outros abriram-se num riso absurdo enquanto Armindo corre a deixar os utensílios nas suas origens, e a Sra. Prastes vem de longe, da sala, olhos fora de órbita fixos nas mãos do marido que pingam ainda pingam a bebida verde, sem mexer as íris ou um músculo do rosto ela exclama voltando a companhia das outras senhoras: - Até que demorou muito para que acontecesse uma “brincadeirinha” desse tipo.
Palavras não adiantariam e era tão rotineiro o episódio que foi lavar as mãos, banheiro desocupado só no segundo andar, e ele não perdeu tempo, o encontro estava tão bom, que não queria desperdiçar seu tempo de glamour higienizando o que quer que fosse. O primeiro banheiro que encontrou, sim estava aberto, mas não desocupado, pois só num segundo sentido é que pode sentir o vapor do chuveiro, ouvir a água correndo, e ver a Sra. Estrelícia Novaes banhando-se... Seu escultural corpo totalmente nu, as curvas na medida certa, os seios tão bem formulados, e o sexo como uma obra de arte... O coração parou, o mundo e mais dois terços dele também pararam, a mulher sob o chuveiro olhava-o inexpressiva, paralisada, encontraram-se as nuvens oculares. Nada de palavras, nada de qualquer reação, mas os passos foram lembrados no silêncio e sem lavar as mãos Prastes abandonou aquela cena divina.
CONTINUA
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